Fazer rir é a rebeldia de Iván Prado*

*Texto em parceria com Rafael Donadio e especial para o concurso Expressões da Vida Real da ExpressoCom

Em espanhol “payaso” ou “hazmerreír”. Em português, “palhaço”. No dicionário, “pessoa que, por atos ou palavras, faz os outros rirem”. Mas para Iván Prado, pouco importa a língua ou a definição, na prática, o verdadeiro trabalho do palhaço é defender o riso como um direito e a alegria como parte indispensável da dignidade humana.

“A linguagem do palhaço é uma linguagem universal, que se sustenta na esperança da criança interior, indo contra as regras e leis estabelecidas”, diz ele.

Iván é mais conhecido como Capitán Jadoc, o clown que diz ser diariamente. Afinal, segundo ele, todos têm um palhaço interior. Ele tem 40 anos, nasceu em Lugo, Galícia, na Espanha e, hoje, viaja o mundo todo realizando apresentações e oficinas e atuando em causas sociais, algo que ele sonhou fazer desde pequeno, quando queria ganhar dinheiro para acabar com a fome mundial.

“Minha preocupação pelas causas sociais iniciou na infância. Me lembro de ter passado noites em claro, rolando na cama, por ver e lembrar de pessoas pedindo dinheiro nas ruas”, conta.

Começou a trabalhar com 15 anos, como pedreiro. Chegou a frequentar a universidade já mais velho, com 30 anos, mas por um curto período, porque já estava muito ligado ao trabalho social e não tinha muito tempo para os estudos.

Como palhaço, iniciou em 2003, quando acompanhou uma caravana de artistas para a Palestina. “Aí, descobri a força que tem o palhaço para defender a humanidade, a capacidade que tem para levantar a bandeira da esperança num lugar de conflito e de genocídio como a Palestina, a capacidade que tem para se conectar com o coração do ser humano, e por fim, que os palhaços são um escudo da liberdade, um trampolim para a possibilidade de que o dia de amanhã seja melhor”, descreve Jadoc.

Hoje, ele faz parte da organização Pallasos en Rebeldía, que já esteve vários lugares como o deserto do Saara e o Líbano. E foi responsável, também, pelo primeiro festival de clowns do mundo, ao lado de Patch Adams, outro famoso palhaço ativista.

Mês passado, esteve no Brasil para cumprir uma extensa agenda de atividades pelo País, oportunidade em que passou por Maringá para ministrar oficinas e uma palestra. Além disso, ele encontrou várias causas para apoiar no Brasil. “Trabalhamos com o Movimento Sem Terra, nas favelas do Rio de Janeiro e de São Paulo e também com a tribo indígena Cariri Xocó, que tem muitos problemas com a demarcação de terras”, explica o espanhol.

E para quem pensa que para realizar este tipo de trabalho basta apenas boa vontade, Iván mostra que é preciso muita coragem. Em 2010, ele foi preso na Palestina pois os governantes não queriam que o festival fosse realizado ali. Mas em 2011, persistente, ele voltou e acabou conseguindo realizar o, até então, primeiro festival de palhaços do país.

Em 2013, as apresentações aconteceram na Faixa de Gaza. “Apresentamos para 400 a 700 crianças e ouvíamos o barulho do bombardeio do lado de fora. Durante a peça a gente aguentava porque as crianças gostavam e aplaudiam para que a gente continuasse, mas depois a gente juntava as coisas e fugia rapidinho”, relata Iván.

Para ele, no início de cada ação humana damos de cara com duas possibilidades: a do medo ou a do amor. “A justiça nasce de assumir a globalidade que somos, a fraternidade do amor mais profundo e a igualdade a generosidade de amar”, afirma.

Ele acredita, além disso, que é necessário voltar a ser criança, abraçar a alegria e a felicidade, descobrir a liberdade e deixar o medo da estupidez. E é para isso que ele faz as oficinas intituladas Palhaceando a Existência: “A estupidez humana é o que permite que existam exércitos, polícia e homens que maltratam mulheres. É uma maneira de lembrarmos que ainda não temos o lugar belo, justo e democrático que a humanidade merece. A estupidez tem suas coisas negativas, mas desse erro a gente pode aprender e criar.”

E todas as ações do “artivista”, como ele define as pessoas que ajudam o mundo por meio da arte, devem ter o mesmo objetivo. “Precisamos transformar nossa vida como seres humanos e como sociedade, para que o planeta tenha uma existência mais lógica, prazerosa, bela e feliz.”

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